OK! O blog foi feito pra eu escrever sobre o mestrado, sobre a vida em Paris, sobre trabalho, estágio, etc....Mas como ficar indiferente com um fato tão marcante em minha vida: a despedida do meu avô?
Ele partiu!Foi!Passou pro outro lado!Sublimou!
Eu fiquei... exatamente aqui... com a sensação de que faltou algo a dizer, um carinho pra fazer, uma palavra de gratidão.
Meu avô sempre foi meu amigo. Uma figura única, pessoa que tinha um amor enorme pela vida e uma vontade enorme de viver. Exigente! Sempre queria as coisas na hora e do jeitinho dele, enquanto não fazíamos o seu gostinho ele ficava injuriado. Usava boininha, era sãopaulino, gente boa, tomava um vinhozinho antes do almoço e era dengoso que só ele. Ah! Muito vaidoso também, penteava os poucos cabelinhos que lhe sobraram várias vezes ao dia e ainda passava creme pra não ficar com a pele seca, prá não rasgar, como ele dizia. Ele combinava cores na roupa. Meu avô tinha muitos amigos, era bom em matemática, comia dois filõezinhos com uma caneca de leite morno todas as manhãs. Meu avô ficou casado mais de sessenta anos com a minha avó, se aguentaram em muitas crises, mas estiveram sempre juntos e ele sempre dizia que amava ela. Meu avô tinha bom humor, sabia rir de piada, adorava um mal-feito e encasquetava com certas coisas de vez em quando.
Usava bengala!Quantas histórias dessa bengala.... Ligava no meu celular e perguntava quem tava falando quando eu atendia, só pra me fazer rir.... Ele ajudou muita gente... ele amou minha mãe.
Ele podia ter mil defeitos, ter cometido mil erros na sua vida, pode ter sido meio chatinho às vezes, mas não importa....porque ele foi um vôzãoooo. Ele se preocupava comigo, ele gostava da minha presença....ele nunca me julgou, ele me tirava pra dançar!
Meu avô era um querido, se de todas as funções que ele teve nessa vida, se alguma ele não cumpriu bem, eu não sei, o que eu sei é que ele foi um avô maravilhoso, um avô pai...presente, companheiro, delicado, discreto, educado, carinhoso, ele cumpriu maravilhosamente bem a sua função de avô.
Meu avô foi um homem bom!
Meu avô e minha avó me criaram ( velha história de pais separados que trabalham muito), dentro da casa deles eu vivi todas as minhas fantasias de infância. Eu e meus irmãos fazíamos da casa dos nossos avós o nosso universo lúdico: brincávamos de tudo....o lençol da cama deles pendurado no varal com pregadores foi desde cabaninha do índio até o castelo rá-tim-bum. O corredor do quintal foi escola, foi hospital, foi padaria, confeitaria, galáxia zodíaca, balão mágico, tapete voador, floresta amazônica, paraíso perdido...as massinhas que a vó fazia com farinha se transformavam em tudo, e o vô já foi de mágico a cobrador de ônibus nas nossas histórias. Será que isso pode voltar um dia?só um....
A vó fazia quitutes, a gente comia, se lambuzava...o vô dava folhas e mais folhas de papel pra desenhar, pra fazer continhas.... Depois a gente cresceu, e o carinho, e o cuidado, tudo continuou igual.
Por isso é tão difícil, entendem? Todo mundo diz: eles estavam velhinhos...a hora chega....é a vida....EU SEI! É óbvio que é o ciclo da vida... que eles estavam velhinhos, e tudo e tal....mas e tudo isso? E minhas raízes? E tudo isso que, se estou certa, posso chamar de AMOR PURO. Sem julgamentos, sem juízo de valor...simples assim, gratuito!
Posto este texto como um desabafo, como gratidão, como explicação, como que para ajeitar as gavetas que estão mal arrumadas dentro de mim.... ou ainda pra me despedir!
Posto porque não quero guardar!
E também pra dizer até logo....pq quando for a minha vez de partir, se eu puder escolher...é pra casa deles que eu vou. É lá que eu quero ficar!